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Início, fim, pedreiras e legados
Fazer revista é aventura arriscada, sobretudo em país que tem fama do mal dos sete números: se a revista resistir a sete edições, talvez vá adiante, mas quase sempre (não se sabe se é maldição ou desejo inconfesso de gente maldosa) fracassa antes disso. Rasura correu esse risco, embora nem tenha pretensões comerciais, lançou o número zero para testar e suspendeu por dois semestres os lançamentos, por conta de percalços no caminho. É com alegria, portanto, mesmo tingida por certa apreensão, que enfim se lança o primeiro número da revista. Longa vida a ela, se possível muito acima dos sete números.
Como se sabe, o produto vem dos textos escritos na matéria Oficina de Texto 1, da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília. Neste segundo semestre de 2023, a ideia foi concentrar esforços num único gênero de não ficção: o ensaio. Tome ler Montaigne e gente mais contemporânea como o argentino Alan Pauls ou o sociólogo e escritor brasileiro Evandro Cruz Silva; dá-lhe revista serrote, eis aqui alguns ensaios de referência para vocês, jovens ingressantes à vida adulta; vamos ler e discutir os pormenores, editar os textos e entender que sempre se pode melhorar. A ver se conseguem alinhar de forma coerente a linha do próprio raciocínio — e não é que parece ter dado certo?
Segue um resgate importante, o texto de Matheus Soares, que tinha se destacado pela ousadia e coragem, mas num semestre anterior que não chegou a ter edição da revista. O texto agora está aí para ser lido e apreciado.
Da turma atual, houve um ensaio que recebeu muitos votos na hora de fazer as escolhas daquilo que se destacava e também chamou atenção, o relato de Vinícius de Oliveira a respeito da relação com o próprio cabelo black power, com o qual ele diz que pretende ser enterrado um dia, na eventualidade de morrer. Que tenha raspado o cabelo ao fim do semestre é aposta que o autor fez de que a data está ainda bem longe no horizonte, porque terá que esperar pelo menos até o cabelo crescer de novo, de preferência até ultrapassar essa fase. Longa vida também ao Vinícius.
Há um ensaio bem instigante que mostra que o mundo mineral das pedras consegue inspirar os mais elevados sentimentos. É o que Ana Clara Andrade de Paula comprova, ao escrever a respeito da bolivianita, pedrinha muito da simpática e que ficou no meio do caminho não para atrapalhar poetas, mas para inspirar novas perspectivas e servir como modelo de educação, que me perdoe o João Cabral pelo empréstimo meio torto das ideias.
Entretanto, o mundo tem faces bem mais ásperas, como comprova outro dos textos da edição, o de Izadora Lemos. De forma pungente, ela relata as visitas que fazia ao pai na Papuda de uma perspectiva da infância forçada a atravessar todo tipo de obstáculos que o destino às vezes reserva, mais para uns do que para outros, forçados ao convívio com violências de toda ordem. Duvido a leitura não emocionar os corações, por mais empedrados.
Por fim, há uma reflexão a respeito da morte e do morrer, não com o peso que em geral se associa ao assunto, mas de forma leve e espirituosa, reflexo do humor provocativo que tem o autor, Eduardo Borges.
Resumo de tudo: a revista está variada e estimulante, como deve ser. Gostem, não gostem, é com vocês, leitores. Mas se possível lembrem-se de fazer comentários para ajudar no aprimoramento. Tomara que os novos professores e alunos que vêm aí nos semestres posteriores aceitem o legado e o façam seguir adiante. Afinal, como diz a letra daquela música do Aldir Blanc, pra frente é que se anda.
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